Sensibilidade demais não funciona
22 de abril de 2016Já me arrancaram um sorriso de lado. Meio de lado. Meio calado, alado, avexado. Sabe aquele que sai sem convite? Esse. É disso que eu tô falando.
Um riso moleque, travesso, desmesurado. Que vem pro canto da boca, alarga os lábios, salta luzidio nos olhos. Risos que nos indagam, provocam, nos fazem loucuras de trinta segundos. Mais do que mágico pela falta de motivo; ou pra quem necessita, uma razão morna para justificação.
Ser pego sozinho, assim, consigo, é. Um sorriso que por vezes brigamos, polimos, votamos. Que delata iminências, uma mão no celular, uma mensagem que dá pra isso. Uma delícia de quem está turrão, convertido por um ato heroico de alguém que lhe foi palhaço por um dia. Eu prefiro dos mais insanos, quando do nada algo inunda lá dentro, transborda, e você ri agradecido.
Todavia, jamais hão de ser exclusos esses risos de paixonite. São tão divertidos. Aqueles que ficam no entrega, não entrega. Aqueles que se dão de cabeça baixa, num relapso que escorrega o quanto se quer, entre os dedos que tiram o cabelo que cai na cara. Aqueles que, até os quarenta e cinco do segundo tempo, ainda estão no 0x0.
Sobretudo, arrancaram-me forte essas faíscas de felicidade. Foi aí que me senti dono do mundo. Acho que todo mundo, um dia, teve essa sensação. Algo grato, divino, ritmado. Algo que é só seu, quando você se convence de não precisar de mais nada – ao passo que essa alegria discreta já foi bem instalada. Seja por um elogio, um gesto, uma carta, uma música dedicada, o que cala a boca para sorrir só para você. Sem plateia.
E o que tem nisso? Não sei, mas é bom. Prefiro ter a não explicá-lo. É sempre contento ser feliz à toa, igual à-toa, pode ser assim também. Perder-se numa abstração, num sonho impossível, num fim de tarde clichê, esboçar graça todas as vezes que o sol abrir num final de semana.
Aí você passa a entender, usar lógicas despropositais, contar com a sorte. Ser amigo do acaso. Aguardar o que vem, segurando um sorriso como isca, pronto para pegar lampejos que lhe roubem das desventuras do dia a dia. No instante que uma gargalhada de bebê lhe tirar do sério, quando você fechar os olhos numa brisa, bailar com a música e as lembranças prediletas, fizer etecetera e tal, aí saberá o sentido que há.
Enquanto não há, cacemos. Cacemos o improvável, deslembremos trabalho, a atividade atrasada. Permita-me permitir. Permita-se permitir. Permita até certo ponto, depois abandone a permissão. Deixe-se levar, perca-se quando der; e se não der, tente voar em casa. E eu, que esses dias andei pensando que nada tinha, olhei da janela – em movimento – o céu, e ainda tinha estrelas que nunca contei…
Olhei para o chão, vi tanta gente que não vivi.
O quanto podemos fazer antes de amanhã, depois de ontem.
Foi então que assumi…
Já me arrancaram um sorriso de lado.